terça-feira, 14 de julho de 2015

O novo conceito de família

 A partir da leitura dos textos da coletânea e, com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija texto dissertativo-argumentativo em norma padrão da língua portuguesa que busque responder: por que o conceito de família deve mudar? ". apresentando proposta de intervenção, que respeite os direitos humanos.
 Selecione, organize e relacione, de forma coerente e coesa, argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista.
Texto 1
Qual é a definição correta de família? Existe um conceito correto? As definições antigas dão conta da diversidade que a sociedade contemporânea vivencia em suas relações? 
Para muitos essa é uma questão polêmica. No Brasil, o tema ganhou destaque após o site da Câmara dos Deputados colocar no ar uma enquete que questiona se você é a favor ou contra o conceito de família como núcleo formado “a partir da união entre homem e mulher”, prevista no projeto de Lei 6583/13, do deputado Anderson Ferreira (PR-PE), que cria o Estatuto da Família.
O deputado argumenta que “a família vem sofrendo com as rápidas mudanças ocorridas em sociedade” e, no texto do projeto, apresenta diretrizes de políticas públicas voltadas para a entidade familiar e obriga o poder público a garantir as condições mínimas para a “sobrevivência” desse núcleo. A proposta dele define família como o núcleo formado a partir da união entre homem e mulher, por meio de casamento, união estável ou comunidade formada pelos pais e seus descendentes. 
A família é um fenômeno social presente em todas as sociedades e um dos primeiros ambientes de socialização do indivíduo, atuando como mediadora principal dos padrões, modelos e influências culturais; se define em um conjunto de normas, práticas e valores que têm seu lugar, seu tempo e uma história.
Muitos fatores contribuem para dar forma ao que reconhecemos como família: as normas e ações impostas pelo Estado (quando ele beneficia determinado tipo de família em questões legais, previdenciárias, acaba legitimando este tipo e desestimulando outros) , as relações trabalhistas (quando as oportunidades no mundo do trabalho moldam as escolhas feitas pelos indivíduos na vida pessoal), o âmbito da sexualidade e afetos, as representações dos papéis sociais de mulheres e homens, da infância e das relações entre adultos e crianças, a delimitação do que é pessoal e privado por práticas cotidianas, e as leis. Tudo isso interfere na vida doméstica e molda os papéis de homens e mulheres dentro e fora de casa.
No Brasil, o conceito de família teve diferentes abordagens. Na Constituição Federal de 1967, anterior ao regime democrático, o artigo 167 descrevia que “a família é constituída pelo casamento". Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 o conceito de família foi ampliado e passou a ser entendido como “a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. 
Pelo Novo Código Civil Brasileiro, instituído em 2003, a família deixou de ser aquela constituída unicamente através do casamento formal, ou seja, composta de marido, mulher e filhos. No Código de 1916, em vigência anteriormente, o casamento definia a família legitima e legitimava os filhos comuns. 
O novo código reconhece que a família abrange as unidades familiares formadas pelo casamento civil ou religioso, união estável ou comunidade formada por qualquer dos pais ou descendentes, ou mãe solteira. O conceito de família passou a ser baseado mais no afeto do que apenas em relações de sangue, parentesco ou casamento.
Já o IBGE, para realizar o Censo em 2010, definiu como família o grupo de pessoas ligadas por laços de parentesco que vivem numa unidade doméstica. Essa unidade doméstica pode ser de três tipos: unipessoal (quando é composta por uma pessoa apenas), de duas pessoas ou mais com parentesco ou de duas pessoas ou mais sem parentesco entre elas. 
O levantamento fez um retrato da família brasileira: na maioria das unidades domésticas (87,2%) as famílias são formadas por duas ou mais pessoas com laços de parentesco. As pessoas que vivem sozinhas representam 12,1% do total e as pessoas sem parentesco são 0,7%. Na comparação entre 2000 e 2010, houve um crescimento na proporção pessoas morando sozinhas (antes de 9,2%) e de famílias tendo a mulher como responsável (de 22,2% para 37,3%), fato que ocorre, principalmente, pela emancipação e ingresso da mulher no mercado de trabalho.
Especialistas e intelectuais afirmam que não há um conceito único de família e que ele permanece aberto, em construção, e deve acompanhar as mudanças de comportamento, religiosas, econômicas e socioculturais da sociedade. Alas mais conservadoras da sociedade e de diferentes religiões não compartilham dessa visão e mantém o entendimento de que o fator gerador da família é o casamento entre homem e mulher, os filhos gerados dessa união e seus demais parentes. 
Mas, com o passar do tempo, novas combinações e formas de interação entre os indivíduos passaram a constituir diferentes tipos de famílias contemporâneas: a nuclear tradicional (um casal de homem e mulher com um ou dois filhos, sendo a relação matrimonial ou não); matrimonial; informal (fruto da união estável); homoafetiva; adotiva; anaparental (sem a presença de um ascendente); monoparental (quando apenas um dos pais se responsabiliza pela criação dos filhos); mosaico ou pluriparental (o casal ou um dos dois têm filhos provenientes de um casamento ou relação anterior); extensa ou ampliada (tem parentes próximos com os quais o casal e/ou filhos convivem e mantém vínculo forte); poliafetiva (na qual três ou mais pessoas relacionam-se de maneira simultânea); paralela ou simultânea (concomitância de duas entidades familiares), eudomonista (aquela que busca a felicidade individual), entre outras. 
O principal desafio é reconhecer a legitimidade desses novos tipos de famílias, que precisam dessa oficialização para ter seus direito jurídicos, previdenciários, entre outros, garantidos. Quando o Estado e a sociedade não reconhecem essas famílias como legítimas (por diferentes motivos), devido ao conflito entre os valores antigos e o estabelecimento de novas relações, acabam estimulando alguns modos de vida e desestimulando outros. No entanto, isso acaba oferecendo proteção e vantagens para uns em detrimento de outros. 
“A ideia de que a família corresponde ao casamento, heterossexualidade e procriação determinou por muito tempo a fronteira da legitimidade das famílias”, comenta a autora Flávia Biroli no livro Família – Novos Conceitos, ao falar da noção moderna de família. 
Segundo ela, a ruptura, ainda que parcial dessa idealização do conceito de família é resultado da ação de movimentos sociais, feministas e LGBT, e de juristas e políticos que entenderam que os direitos individuais incluem o direito de casar-se e o serem beneficiados com as vantagens relacionadas ao casamento nas nossas sociedades.
Além da diversidade de tipos de família na nossa sociedade, ainda precisamos compreender a realidade de outros países e culturas (principalmente as não ocidentais), onde muitas vezes um comportamento que é proibido em nosso território, é permitido. Entre esses comportamentos estão a exogamia (união de membros de grupos diferentes, como japonês com alemã, italiano com africana, etc), a endogamia (união entre parentes ou pessoas com a mesma ascendência), a bigamia, o incesto, a poligamia, entre outros.
Se voltássemos a Idade Média, veríamos que não eram incomuns casos de reis e rainhas europeus que se casando com primos e irmãos para manter unidos seus reinos e fortunas. No caso da poligamia, um casamento que engloba dois ou mais parceiros, trata-se de uma prática que vem de culturas e religiões antigas, em muitos casos, iniciada pelo fato de existirem mais mulheres do que homens. 
Na África, por exemplo, a poligamia para os homens é permitida e reconhecida legalmente em muitos países, como Líbia, Marrocos, Quênia, entre outros. Na África do Sul a poligamia é um direito que está na Constituição. Qualquer homem sul-africano pode ser casado com até quatro mulheres. Todas recebem o sobrenome do marido e têm os mesmos direitos perante a lei. 
No caso da poligamia para mulheres (chamada poliandria), por muitos séculos ela foi praticada no isolado Vale Lahaul, no Himalaia, na Índia. Ali, era muito comum o casamento de irmãos com a mesma mulher, por exemplo. Essas famílias eram pequenas, como o trabalho não era distante não havia muito contato com outras aldeias. Hoje, com o desenvolvimento do local, o crescimento econômico e os avanços tecnológicos, o vale antes isolado ganhou estradas, telefones, e a população pode se deslocar, trabalhar longe e almejar outra vida. As famílias poliândricas começam a desaparecer. 
O mais importante nesta questão é que a diversidade da vida afetiva e familiar seja abordada de maneira que seu contexto e papel sejam compreendidos antes de serem julgados e que garanta a igualdade dos indivíduos – no acesso a recursos e ao reconhecimento social, e também na sua autonomia para tomar decisões sobre a própria vida. Andréia Martins http://vestibular.uol.com.br/resumo-das-disciplinas/atualidades/familia-sociedade-coloca-conceito-do-fenomeno-em-disputa.htm
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Texto 2 ( opcional: leia se quiser aprofundar o tema)

texto 3 
Frases como a do deputado Ronaldo Fonseca (Pros-DF) causam perplexidade aos estudiosos do Direito “faz-se necessário diferenciar família das relações de mero afeto, convívio e mútua assistência; sejam essas últimas relações entre pessoas de mesmo sexo ou de sexos diferentes, havendo ou não prática sexual entre essas pessoas. É importante asseverar que apenas da família, união de um homem com uma mulher, há a presunção do exercício desse relevante papel social que a faz ser base da sociedade”. Há no discurso uma clara visão utilitarista: a família de pessoas do mesmo sexo não cumpre sua função última, “ser base da sociedade”. Haveria duas famílias: as úteis e as inúteis para a base da sociedade. É argumento que já legitimou atrocidades em passado não tão remoto.

Texto 4

Ingerência estatal

Eis que o Estado brasileiro decidiu arvorar-se no direito de decidir quais arranjos familiares são dignos e quais são indignos para a criação de indivíduos psicologicamente saudáveis. A ingerência estatal em domínio eminentemente privado, uma vez que a felicidade não pode ser construída baixo decreto presidencial, é flagrante na discussão do chamado Estatuto da Família, projeto de lei proposto pelo deputado federal Anderson Ferreira, do Partido Republicano. Pode-se dizer, até, que o projeto não começa de todo mal, em seu artigo 1º esclarecendo que o Estatuto dispõe “sobre os direitos da família, e as diretrizes das políticas públicas voltadas para a valorização e apoiamento da entidade familiar”, sendo obrigação do Estado, da sociedade e do Poder Público, de acordo com o artigo 3º, “assegurar à entidade familiar a efetivação do direito à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania e à convivência comunitária”. O banho de água fria vem, entretanto, no artigo 2º, em que a “entidade familiar” é definida como o “núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher (grifo do projeto de lei), por meio do casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

domingo, 12 de julho de 2015

Crianças podem se apresentar em bailes funk?


Esta proposta não é para o Enem.

Escreva uma dissertação. 

 fONTE: FOLHA DE SÃO PAULO

TEXTO 1

ADRIANA FACINA: MORALIZAR OS POBRES

O que se observa na sociedade brasileira é um desejo amplamente difundido de moralizar os pobres. Modos de vida, manifestações culturais, fazeres artísticos e formas de sociabilidade populares são permanentemente estigmatizados e até mesmo criminalizados.
Crianças pobres, negras, que moram nas periferias brasileiras crescem sem creches ou escolas públicas de qualidade. Desde pequenas, essas crianças compartilham de uma cultura de sobrevivência que transforma dor em arte.
Elas estão nos terreiros, soltando pipas nas lajes, nas quadras das escolas de samba e nos bailes funk. Os pais não contam com babás e têm de levar os filhos para seus divertimentos –necessário para alimentar alma e corpo para rotinas de trabalho estafantes– com muitas horas perdidas nos deficientes transportes públicos.
Nesse contexto, o funk, assim como outras formas de diversão e lazer, pode representar também esperança. Possibilidade concreta de mudar de vida, de sonhar com reconhecimento, com a vida farta que todos queremos.
Muitos dos que se escandalizam com as performances dos MCs crianças apoiam entusiasticamente a redução da maioridade penal, a despeito de a Unesco estimar em apenas 1% os homicídios cometidos por menores de idade no Brasil.
Essa preocupação tão intensa com a "sexualização" das crianças não deveria vir acompanhada de medidas protetivas gerais e de valorização da vida dos pequenos?
"Primeiro a barriga, depois a moral." É com essa frase que o poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht (1898-1956) criticava a moral burguesa que busca universalizar critérios de julgamento das condutas humanas como se todos vivêssemos realidades iguais.
Dizendo de outra maneira, para que todos nós pudéssemos ter nosso comportamento em sociedade avaliado pelos mesmos parâmetros teria de haver igualdade social (e não somente jurídica ou formal).
Radicalizando ainda mais, Brecht defende que em situação de escassez, material ou de direitos, não há moralidade possível. A moral depende, portanto, de condições de vida dignas, já que precariedade é a maior imoralidade de todas.
Essas crianças, no entanto, têm contato com a morte violenta desde muito cedo. Pequenas ainda assumem tarefas como cuidar de irmãos, do lar e mesmo ajudar seus pais em trabalhos variados para garantir a sobrevivência da família.
Os olhos dessas crianças envelhecem mais cedo que seus corpos, pois elas vêm e vivem coisas que nenhuma criança deveria ver e viver. Elas são alvo e podem morrer com um tiro na cabeça, como aconteceu há poucas semanas com o pequeno Eduardo, no Complexo do Alemão.
Ao que tudo indica, o tiro partiu da polícia e, infelizmente, não foi o único nem será o último tiro dado pelo Estado brasileiro em crianças faveladas. Só em 2012 foram mais de 30 mil jovens assassinados no Brasil, de acordo com a Anistia Internacional. Quase todos eram pobres e, em sua maioria, negros.
Não podemos esquecer, por fim, da farta contribuição midiática para a exposição do sexo e do corpo feminino como mercadorias, disponíveis para todas as idades, nos comerciais, publicações e atrações televisivas variadas.
Se estamos de fato preocupados com nossas crianças, e não apenas repetindo velhos preconceitos gerados na casa-grande, temos de ampliar sensivelmente nosso escopo de indignação.
Se para cada criança violada em seus direitos batêssemos uma panela, nosso batidão seria capaz de produzir o maior e mais ensurdecedor baile funk do mundo.
ADRIANA FACINA, 44, antropóloga, é professora do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social/Museu Nacional/UFRJ

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TEXTO 2
Crianças podem se apresentar em bailes funk? Não
09/05/2015  02h00
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CORONEL CAMILO: CONVIVÊNCIA COM LIMITES
O funk é uma forma de expressão cultural, mas algumas de suas letras apresentam conotações eróticas. A tendência contemporânea, entretanto, traz à discussão um problema: a erotização das crianças.
Pela forma como o funk se propaga, principalmente por meio das redes sociais, e pela forma apelativa com a qual algumas pessoas exploram, o assunto foi levado ao Ministério Público.
Não sou contra as manifestações culturais, desde que elas não interrompam a infância ou antecipem fases da vida. Não é natural uma criança de oito anos que deve brincar e estudar ser incentivada a cantar letras de cunho erótico e reproduzir coreografias sensuais.
Em geral, os bailes funks são locais onde há o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, ocorrem tarde da noite –geralmente varam a madrugada– e muitos deles não têm autorização do poder público para funcionar.
Em muitas ocasiões há o uso de drogas, como já flagrado pela polícia, objeto de prisões e mesmo mostrado em noticiários, por meio de reportagens com filmagens ocultas.
Dessa forma, como saber, então, se no desenrolar de um baile funk o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) está sendo cumprido?
Crianças e adolescentes são pessoas em processo de desenvolvimento e têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade.
O estatuto assegura a ida e a permanência de crianças em espaços públicos, mas desde que obedecidas as restrições legais. Uma delas é a vedação à frequência em ambientes onde há pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. Então, se nesses bailes houver consumo de drogas, em hipótese alguma a criança ou o adolescente podem estar presentes.
É preciso entender que é dever de todos prevenir a ameaça ou a violação dos direitos dos adolescentes. A criança tem o direito à cultura e ao lazer, mas desde que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
A lei obriga o poder público a regular esse tipo de entretenimento. É o que diz o artigo 74 do ECA: "O poder público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada."
Ainda deve ser afixada na entrada do evento, em local visível, a faixa etária e a sua natureza. E as crianças menores de dez anos ainda têm que estar acompanhadas dos pais.
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar a dignidade, o respeito e a convivência comunitária, que tem que ter limites.
O excesso de erotização infantil, as roupas extremamente curtas, os movimentos insinuantes, a convivência em ambientes com excesso de consumo de álcool e o som em volumes acima do recomendado para a saúde de qualquer adulto, quiçá de uma criança, são incompatíveis com a formação dos nossos meninos e meninas.
Vejamos o exemplo dos bailes de Carnaval. Por tradição, os clubes organizam seus bailes de forma a propiciar bailes para adultos e as matinês, onde os pais vão com suas crianças em busca de diversão sadia e de acordo com a faixa etária compatível com o seu estágio de desenvolvimento.
Modas musicais passam, mas a cultura e os valores que resultam disso precisam ser levados muito a sério para que nossas crianças tenham direito de brincar e serem respeitadas como crianças.
ALVARO BATISTA CAMILO, o Coronel Camilo, 54, é deputado estadual pelo PSD-SP. Foi comandante-geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo (governos Serra, Goldman e Alckmin)